quarta-feira, 27 de maio de 2009

3º mandato - Lúcia Hippolito adverte Gilmar Mendes: “É preciso refinar o argumento”

Blog de Lúcia Hoppolito
Discussão sobre o terceiro mandato

É preciso refinar o argumento

Até agora, os argumentos mais frequentes -- e mais fraquinhos -- sobre o terceiro mandato vinham sendo apresentados pelo presidente Lula. Perguntado sobre o assunto, o presidente respondeu que não fala sobre terceiro mandato, porque a hipótese não existe.
E se existisse, qual seria a posição de sua Excelência, contra ou a favor? Aceitaria, docemente constrangido, ou recusaria enfaticamente?
Mas o mais decepcionante são os argumentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Dali têm partido dois argumentos básicos.
Afirma o ministro Gilma Mendes, presidente do STF, que terceiro mandato é casuísmo. É claro que é, Excelência. Mas também era casuísmo a adoção do instituto da reeleição com permissão de que o ocupante do cargo disputasse. E no entanto, foi o que aconteceu.
A reeleição entrou na Constituição, e o presidente Fernando Henrique candidatou-se. E foi reeleito.
Portanto, a recusa do terceiro mandato porque é casuísta não se sustenta. Se a emenda for aprovada conforme manda a Constituição e se houver um referendo popular para ratificar a medida, casuísta pode ser, mas não é inconstitucional.
E é sobre sua constitucionalidade que deverá, eventualmente, se manifestar o colegiado do STF.
O segundo argumento é o do anti-republicanismo, defendido, por exemplo, pelo ministro Marco Aurélio Mello e pelo ministro Ayres Britto. Lamento, Excelências, mas tampouco se sustenta. É igualmente fraco.
Um dos países mais ferrenhamente republicanos que se conhece, a França, país que tem horror a tudo o que remotamente lembre monarquia, tem um presidente da República poderosíssimo e um primeiro-ministro fraco.
Na França não existem limites para a reeleição. O presidente pode ser reeleito quantas vezes o eleitorado aguentar. O que se passa é que o mandato era de sete anos (muito longo), e os presidentes já eram eleitos muito idosos. Assim, não passavam do segundo mandato.
Desde 2000, emenda constitucional ratificada por referendo reduziu em dois anos o mandato presidencial. Vamos ver a partir daqui, com Nicolas Sarkozy jovem e cheio de energia, e um mandato de cinco anos, como vai ser a sucessão presidencial francesa.
Outro país visceralmente republicano, os Estados Unidos, também não limitavam as reeleições de seus presidentes. Mas não havia caso de mais de dois mandatos, pelo mesmo argumento descrito acima. Os presidentes americanos eram idosos quando assumiam.
Mas foi apenas quando Franklin D. Roosevelt foi eleito para o quarto (!) mandato é que os americanos decidiram aprovar uma emenda constitucional limitando a dois os mandatos presidenciais.
Não porque a reeleição ilimitada fosse anti-republicana, mas porque a dinâmica do processo político ficara muito engessada. Com a morte de Roosevelt, tanto democratas quanto republicanos viram-se repentinamente sem novas lideranças.
Os americanos decidiram que dois mandatos mantêm a oxigenação da política, com a formação de novas lideranças.
Atualmente, com presidentes americanos muito mais jovens, o país vai ter que se defrontar com situações como a de Bill Clinton, fora do jogo político com menos de 60 anos. Ou como a de Obama, daqui a oito anos (se cumprir dois mandatos).
Em suma, tamanho de mandato é assunto de consenso político. Não é cláusula pétrea da Constituição, não se trata de usurpação de poder constituinte originário. É matéria de consenso político.
Por isso mesmo, se e quando o tema do terceiro mandato aterrissar no Supremo Tribunal Federal, espera-se dos ministros argumentos mais sofisticados do que simplesmente alegar casuísmo ou anti-republicanismo.

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